''Não se nasce mulher, torna-se mulher'', esta afirmação da filósofa francesa Simone de Beauvoir também significa que são as escolhas, as condições, a educação e o ambiente que condicionam a mulher a tornar-se naquilo que dela esperam. Há quem não aceite adequar-se e voe pelas próprias asas, há quem aceite e tenha pouca capacidade de compreender o pássaro que sabe voar.
Tendo eu sido educada, uma grande parte da infância e adolescência, num colégio interno militar e feminino,bem sei que o feminismo é antes de mais, o respeito pela diferença dos nossos iguais, que infelizmente está longe de acontecer.
As limitações, a essência e as condições de uma pessoa condicionam as suas decisões na vida. Eu nunca senti que me tenha tornado a mulher que a minha família esperava, talvez por ter priorizado o trabalho, não por ambição de carreira ou riqueza, mas porque servindo me curava a mim.
Ainda sinto algum preconceito por ser uma mulher com pensamento rápido (digo isto sem presunção porque esta característica é muitas vezes limitadora), competente no exercício da medicina em contexto hospitalar e que além do mais exerce a medicina de forma integrativa, tendo em conta as várias dimensões do ser humano.
Ainda se espera que uma mulher falhe, como mãe, como esposa, como amiga, como filha ou como profissional. E como o ser humano não é talhado senão para falhar, à mulher não se admite e logo se vê o dedo em riste sempre pronto a assinalar a falha para todo o sempre.
A sociedade ainda castiga as mulheres que escolhem a sua realização profissional e que são o garante da família a nível financeiro.
Nunca se pergunta a um homem onde deixou os filhos para ir trabalhar, já a mulher é tantas vezes questionada. Nunca se parabeniza uma mulher que cuida dos filhos sozinha, já se for o homem a fazê-lo, é considerado um herói. O super-pai é uma figura muito atraente, uma super-mulher é uma figura falhada. Se o homem está solteiro é por escolha, se a mulher está solteira é por incompetência e falha.
Esta sociedade, carregada às nossas costas piora nos países pobres, nos contextos de guerra e em países com fanatismo religioso. É tal a fatalidade do acontecimento que chega a ser uma desgraça nascer-se mulher.
"Eu sou eu e minha circunstância, e se não a salvo a ela, não me salvo a mim" (José Ortega y Gasset, Meditaciones del Quijote, de 1914). Passamos uma vida inteira a salvar a nossa circunstância para nos salvarmos e ainda assim são as nossas semelhantes as primeiras a não compreenderem nos que nos tornaram, elas e nós.
A isto eu chamo falta de empatia e arrogância disfarçada de bondade.
Mas as árvores morrem de pé!
